terça-feira, 24 de agosto de 2021

Laura Popinhak


Texto de Antonio Carlos Popinhaki


Aos 9 dias do mês de junho do ano de 1897, por volta das 11 horas da manhã, na residência do senhor Salustiano Pinto de Andrade, nasceu a sua filha, Laura Quadros de Andrade. O nome da mãe era Cherubina Quadros de Andrade. O pai era natural do Rio Grande do Sul, já a mãe, era natural de Curitibanos. A família de Salustiano e Cherubina era tradicional na vila, portanto, ambos eram bem conhecidos e idôneos.

Quando lhe faltava um dia para completar 16 anos, ou seja, no dia 8 de junho de 1913, Laura casou-se com João Popinhak, o ucraniano que se criou com a família do tropeiro Francisco Carvalho, apelidado de Chico Ruivo. O casamento foi realizado na sala das Sessões do Conselho Municipal, prédio destruído no ano seguinte (26 de setembro de 1914), pela invasão bárbara dos fanáticos liderados por Agustín Perez Saraiva, o Castelhano. João tinha 25 anos na ocasião do casamento. Também, a título de informação, o pai de Laura foi Capitão da Guarda Nacional e na época do casamento, já havia falecido. Após casada, Laura Quadros de Andrade passou a se chamar Laura Popinhak.

O casal não teve nenhum filho natural, mas adotaram, praticamente, uma dezena de crianças, sendo essas, muito bem-educadas e criadas. Alguns, ainda presentemente, contam a todos, com muito orgulho, sobre o amor e a educação que receberam de seus pais adotivos.

Devido ao conflito chamado “Guerra do Contestado”, diante da ameaça e provocação generalizada por parte dos fanáticos, de que não tardariam em incendiar a vila de Curitibanos, João Popinhak e sua esposa Laura, fugiram para uma cidade próxima ao litoral. Se estabeleceram na localidade de Aquidabã (município de Apiúna), onde morou por vários anos.

Resolvi escrever sobre Laura Popinhak, colocando seu nome entre os curitibanenses que foram destaque no passado, simplesmente porque seus feitos de altruísmo foram reconhecidos na época, muitos deles, lembrados até os dias atuais pelos moradores mais antigos de Curitibanos. 

A razão porque o casal não teve filhos foi esclarecida por um depoimento da senhora Soeli Pellegrini Andrade (in memoriam), esposa do seu filho adotivo Hélio da Silva Andrade (in memoriam). Segue o relato: essa Laura foi uma mulher tão resignada, que o que Deus determinou para ela, não é qualquer pessoa que conseguiria viver como ela viveu. Ela morreu com sessenta e quatro anos, com uma resignação de dar inveja. Todos os anos que eu convivi com ela, nunca a ouvi reclamar da sua situação. Na época da Guerra do Contestado, quando havia jagunços por aqui, o casal Popinhak fugiu de Curitibanos e foram morar perto de Blumenau. A Laura estava grávida. Lá, ela precisou passar por um procedimento de cesariana. Imagine isso naquele tempo? Ela me contava tudo. Ele (o médico), estava bêbado e acabou furando a bexiga dela em seis lugares. Ela tinha dezoito anos e viveu a vida toda, até os sessenta e quatro anos com a urina solta. Naquele tempo não tinha fraldas descartáveis. Quando ela ficou doente, eu tinha uma lavadeira só para lavar a roupa dela. Ela era uma santa de mulher”. A criança não sobreviveu à intervenção do médico bêbado. Essa foi a razão por que eles não puderam ter filhos. Entretanto, o amor desse casal por crianças era enorme.

O casal morou na vila de Curitibanos, mas também ficou muito conhecido na localidade de Marombas (Marombas Bossardi), onde tinham um hotel e uma casa comercial. São vários os depoimentos que atestam até os dias atuais, sobre a conduta inabalável de Laura e seu marido. Pouco antes de falecer, a senhora Soeli Pellegrini me telefonou, contou-me sobre os últimos dias de Laura Popinhak. Com o seu consentimento, a conversa foi gravada: “isso é o que sabemos sobre a Dona Laura e o Seu João, que foram pessoas com quem convivemos. Fomos nós, praticamente, que cuidamos dela, quando ela teve um derrame cerebral. Ela veio de Marombas para Curitibanos e ficou na nossa casa. Nós morávamos em Curitiba, voltamos de Curitiba para cuidar dela. Ela ficou enferma um ano e nove meses. Dona Laura ficou, por duas vezes, na minha casa. Só que ela morreu na casa da Vanusa (filha adotiva), porque eu realizei uma cirurgia e o Dr. Altino não permitiu que eu cuidasse dela, porque eu não estava bem. Isso me marcou muito. Quando eu fiz a cirurgia, eu morava ao lado do Lapi Hotel. Parece que eu ainda vejo aquela cena, o Osmar (marido da Vanusa) e o Hélio (filho adotivo de João e Laura Popinhak e marido de Soeli) colocando ela dentro de uma Kombi, numa cadeira de vime. Ela foi para a casa da Vanusa e eu fui para o hospital. Só que quando passaram dois meses, comecei a me movimentar, eu ia todos os dias visitar a Dona Laura. Num domingo, ela mandou me chamar na casa da Vanusa. Eu fui vê-la. Depois de conversarmos, ela me pediu para que a acolhesse em minha casa. Eu disse que sim. Disse que sim, mas eu teria que falar com o Dr. Altino, para saber dele, se eu já estava em condições de cuidar dela. Ele disse-me que não, que eu não estava em condições. Naquela noite ela passou mal, entrou em coma e ficou quatro dias nesse estado de coma. Depois faleceu. Ela dizia para o Hélio: “Ah! Meu filho, se não fosse você, eu já teria morrido há muito tempo”. Ela era um doce de pessoa, uma santa de uma mulher. Se eu fosse contar a história de vida dela seria estarrecedor”.

Na localidade de Marombas, João recebeu a concessão da Superintendência (Prefeitura) para construir uma balsa e explorar a travessia sobre o rio, pois naquele tempo, não havia pontes. O seu hotel era muito frequentado, principalmente, pelo clima acolhedor que lá reinava, reflexo da simpatia do casal proprietário, pelas boas camas, com cobertas de penas e pela excelente comida preparada pelas mãos hábeis de Dona Laura Quadros.

Quando eu era criança, meu pai tinha um amigo que o acompanhava nas suas pescarias. O nome desse senhor era José Cavalcante. Ele morava perto de nossa casa com a sua esposa. Ela se chamava Donata. Chamávamos ela de Dona Donata. Em meados do século XX, esse casal teve uma filha chamada Vanusa. Antes de mudarem para perto de nossa casa, em Curitibanos, eles moravam num lugar muito distante. No interior da região da localidade Marombas, no que as pessoas poderiam chamar na época, de um verdadeiro sertão. A senhora Soeli Pellegrini Andrade contou-me que “ (...) essa Dona Donata estava entrevada de um reumatismo muito crítico. Quando a filhinha do casal estava com seis meses de idade e enferma, o casal não podia cuidar da menina. A Dona Laura Popinhak tomou conhecimento dessa situação e foi lá na casa do casal Cavalcante para ficar com a menina, para cuidar dela até que a situação melhorasse para ambas as enfermas, mãe e filha. Quando a dona Donata melhorou, dona Laura foi a cavalo devolver a menina para a legítima mãe. Só que ela foi chorando porque tinha pegado muito amor pela criança. A Dona Donata não teve coragem de ficar com a filha e a deu para que a Dona Laura a criasse como filha, o que aconteceu até o dia do seu casamento”. O casal Popinhak criou desde pequenos, Hélio Andrade que tinha três meses de idade e a Vanusa que tinha seis meses. Os demais filhos adotivos já eram um pouco maiores de idade. Não foram poucos os filhos adotivos do casal João Popinhak e Laura. De acordo com as palavras de Hélio Andrade, foram mais de dez.

Essa foi a história dessa mulher, que quando assava os seus deliciosos pães, muitas crianças corriam para pedir-lhe um pedaço, pois ela os colocava ainda quentes para esfriarem sobre uma varanda da casa, todos que passavam por perto, sentiam aquele delicioso aroma de pão quente. Ainda temos pessoas em nosso meio que lembram desse aroma. Era inconfundível.

Laura Popinhak faleceu no dia 20 de novembro de 1962, na casa da sua filha adotiva Vanusa, de causa mortis: insuficiência cárdio-pulmonar, conforme atestado pelo Dr. Altino Lemos de Farias na certidão de óbito expedida pelo Cartório de Registro Civil de Curitibanos na época. Muitas pessoas compareceram ao velório e enterro, pois na ocasião, mandou-se imprimir convites, que foram distribuídos aos moradores de Curitibanos.





Referências para o texto:



ANDRADE, Hélio de. Depoimento oral sobre João Popinhak. Curitibanos. 2010.


ANDRADE, Soeli Pellegrini. Depoimento sobre Laura Quadros de Andrade. Lages. 2015.


CASAMENTO de João e Laura Popinhak.  "Brasil, Santa Catarina, Registro Civil, 1850-1999," FamilySearch. On-line: Disponível em: https://www.familysearch.org/ark:/61903/3:1:S3HY-X369-YNM?i=19&wc=MXYL-R3X%3A337701401%2C337701402%2C338276001&cc=2016197


FALECIMENTO de Laura Quadros de Andrade. "Brasil, Santa Catarina, Registro Civil, 1850-1999," images, FamilySearch, 2015. ISSN imagem 218 de 305. Disponível em: https://www.familysearch.org/ark:/61903/3:1:S3HY-62Y9-PG3?i=217&wc=MXYG-128%3A337701401%2C337701402%2C338783801&cc=2016197 — Acesso em: 10 março 2015.


FALECIMENTO de João Popinhak - Índice. "Brasil, Santa Catarina, Registro Civil, 1850-1999," images, FamilySearch, 2015. ISSN imagem 17 de 33. Disponivel em: <https://familysearch.org/pal:/MM9.3.1/TH-267-12327-47485-91?cc=2016197&wc=MXYP-468:337701401,337701402,338835301>. Acesso em: 10 março 2015.


FALECIMENTO de João Popinhak. "Brasil, Santa Catarina, Registro Civil, 1850-1999," images, FamilySearch, 2015. ISSN imagem 225 de 301. Disponivel em: <https://familysearch.org/pal:/MM9.3.1/TH-267-12327-52470-13?cc=2016197&wc=MXYP-4ZW:337701401,337701402,338840401>. Acesso em: 10 março 2015.


Imagem do convite para enterro: Acervo do Museu Histórico Antonio Granemann de Souza de Curitibanos.


LEMOS, Alfredo de Oliveira; LEMOS, Zélia de Andrade. A Guerra dos Fanáticos. Florianópolis: [s.n.], 1984.


LEMOS, Zélia de Andrade. Curitibanos na História do Contestado. 2ª. ed. Curitibanos: Impressora Frei Rogério Ltda., 1983.


NASCIMENTO de Laura Quadros de Andrade. Portal FamilySearch. On-line: Disponível em: https://www.familysearch.org/ark:/61903/3:1:S3HY-X3XQ-KRD?i=158&wc=MXYK-LTG%3A337701401%2C337701402%2C337719001&cc=2016197


POPINHAKI, Antonio Carlos. Popiwniak / Antonio Carlos Popinhaki. — Blumenau: 3 de Maio, 2015. 173 p.


POPINHAKI, Antonio Carlos. João Popinhak. Blog curitibanenses. On-line: Disponível em: http://curitibanenses.blogspot.com/2013/05/joao-popinhak.html


POPINHAKI, Antonio Carlos. O prédio do Museu Histórico Antônio Granemann de Souza. Blog pessoal. On-line: Disponível em: http://antoniocarlospopinhaki.blogspot.com/2021/01/o-predio-do-museu-historico-antonio.html

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