Texto de Antonio Carlos Popinhaki
Pedro Leão de Carvalho, conhecido popularmente como “Pedro Ruivo”, nasceu por volta de 1865 em Curitibanos, Santa Catarina, filho de José Francisco de Carvalho, tabelião local, e Eufrásia Teixeira de Oliveira. Era lavrador e viúvo de Donaria Proença de Carvalho, com quem teve 12 filhos. Sua vida foi marcada por violência e atuação como vaqueano durante a Guerra do Contestado que ocorreu entre os anos de 1912 e 1916, um conflito social que envolveu disputas territoriais e enfrentamentos entre sertanejos e forças oficiais no sul do Brasil.
Pedro Ruivo destacou-se como um dos líderes mais temidos entre os vaqueanos, que nada mais eram do que mercenários contratados para guiar e combater ao lado das forças repressoras (Exército Brasileiro e polícias estaduais). Ele comandou um piquete (grupo de homens armados) que atuou junto à Coluna Norte do Exército, sediada em Canoinhas (SC), participando de incursões brutais contra redutos (acampamentos ou pequenos vilarejos) rebeldes. Sua truculência era notória: relatos históricos e processos criminais o acusam de degolas, estupros, roubos e incêndios, como no caso do assassinato de famílias inteiras e da violência contra mulheres na região.
Em fevereiro de 1915, aliou-se ao capitão Tertuliano Potiguara em uma expedição militar que destruiu redutos rebeldes, como Santa Maria. Sua reputação como sanguinário consolidou-se ao massacrar prisioneiros e apropriar-se de bens de sertanejos e pequenos fazendeiros, enriquecendo ilegalmente.
Após a Guerra do Contestado, Pedro Ruivo também atuou na política local, apoiando o coronel Fabrício Vieira, superintendente de Canoinhas, e ajudando-o a vencer as eleições em 1914. Sua influência persistiu após a guerra, mas suas ações violentas geraram inimizades, especialmente com o adjunto de promotor Hortêncio Baptista dos Santos. Os dois travaram conflitos públicos, incluindo trocas de acusações na imprensa e tentativas de agressão.
Entre 1915 e 1920, Ruivo foi processado por crimes cometidos durante a guerra, incluindo assassinatos e estupros. No entanto, foi absolvido quatro vezes pelo Tribunal do Júri, possivelmente devido a influências locais e relações com jurados. Testemunhas como Bonifácio Massaneiro (um ex-rebelde que se tornou vaqueano) confirmaram seus crimes, mas a justiça falhou em condená-lo.
Pedro Ruivo foi assassinado em Canoinhas por Hortêncio Baptista dos Santos, que alegou legítima defesa após anos de hostilidades. As disputas políticas em Canoinhas eram marcadas pela violência, e a lei frequentemente pertencia ao mais forte. Nesse contexto, um homem desafiava o sistema: Hortêncio Baptista dos Santos. No dia 20 de julho de 1920, em frente ao antigo Hotel Continental, Pedro Ruivo e seus comparsas cercaram Hortêncio, agredindo-o com palavras e golpes. Temendo por sua vida, Hortêncio, que residia no Hotel, fugiu para dentro do prédio. Pedro, armado com um relho, perseguiu-o até a escada que levava ao segundo andar. No momento em que levantou o braço para desferir o golpe fatal, Hortêncio, num momento de desespero, sacou sua arma e atirou, matando o agressor. O crime foi reconhecido como legítima defesa. Baptista foi absolvido, encerrando a vida de um dos personagens mais violentos do Contestado.
Para muitos, a morte de Pedro Ruivo trouxe alívio, visto que ele era conhecido por sua crueldade durante e após a Guerra do Contestado. Assim, o episódio entrou para a história local como um marco do fim de um tempo em que a justiça se fazia pelas próprias mãos. Entretanto, Ruivo deixou um legado de terror, mas também uma família numerosa, como já citado, uma dúzia de filhos e filhas. A edição do jornal O Estado de 18 de maio de 1915 informa que a Pedro Leão de Carvalho foram atribuídos mais de 100 assassinatos.
Sua trajetória ilustra a brutalidade do conflito social denominado de Guerra do Contestado, onde vaqueanos como ele serviram como braço armado de elites locais, misturando guerra, política e criminalidade. Estima-se que tenham morrido mais de 10 mil pessoas no conflito, incluindo civis, soldados e rebeldes. Apesar de sua morte, a impunidade que cercou suas ações reflete as complexas relações de poder e violência no período pós-guerra.
Pedro Ruivo simboliza a face mais sombria do Contestado, onde a lealdade aos coronéis e a ganância justificaram atrocidades, enquanto o Estado falhava em garantir justiça às vítimas. Sua história permanece como um alerta sobre os custos humanos de conflitos fundiários e a militarização da sociedade.
Referências para o texto:
ALVES, Sebastião Luiz. Guerra do Contestado. Curitibanos/SC. Edição do Autor. 2012. 28 p.
CABRAL. Oswaldo R.. Santa Catharina (História - Evolução) Edição Ilustrada São Paulo/SP. Editora Brasiliana. 1937.
CAMPOS, Ricardo de. Caboclos Rebeldes: uma aventura pela guerra do Contestado. Canoinhas/SC: Edição do autor. 2016.
Fotografia disponibilizada na internet.
MACHADO, Paulo Pinheiro. Lideranças do Contestado: a formação e a atuação das chefias caboclas (1912 – 1916) / Paulo Pinheiro Machado. – Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2004.
O Discurso do General. Jornal O Estado. Edição n.º 4, ano I, p. 1. Florianópolis, terça-feira, 18 de maio de 1915.
O Lugar do Contestado na História do Brasil/ Márcia Janete Espig, Alexandre Assis Tomporoski, Delmir José Valentini, Paulo Pinheiro Machado, Rogério Rosa Rodrigues (organizadores) Vitória: Editora Milfontes, 2022. 586 p.
PEIXOTO, Dermeval (Clivelaro Marcial). Campanha do Contestado – Episódios e impressões. Rio de Janeiro: Segundo Milheiro, 1920.
QUEIROZ, Maurício Vinhas de. Messianismo e Conflito Social. 3.ª Edição. São Paulo, Editora Ática, 1981.
SCHRAMM. Carlos. Coisas e Coices. Jornal Correio do Norte. Edição n.º 1965, ano XL. Canoinhas, 21 de maio de 1988. p. 1.
TOTA, Antonio Pedro. Contestado: a guerra do novo mundo. Editora Brasiliense. São Paulo.
1983.
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