Texto de Antonio Carlos Popinhaki
Altino Gonçalves de Farias era o único filho de Marcos Gonçalves de Farias e Francisca Maria de Oliveira Lemos. Seu pai foi, em Curitibanos, um importante gestor nos primeiros anos da República. Nascido em Lages, no dia 9 de novembro de 1882, pouco se sabe sobre a sua infância e juventude, exceto que acompanhou o pai nas lides em Campos Novos e Curitibanos. Encontraremos o próximo registro, relacionado à sua vida, nos anais da igreja católica da antiga localidade de São João Batista, interior de Campos Novos, quando, no dia 20 de janeiro de 1901, casou-se com a jovem Clara de Paula Carneiro, filha do casal Francisco de Paula Carneiro e Maria Clara dos Santos. Na ocasião, ele tinha 19 anos e ela 16.
Clara e Altino esperaram alguns anos para que o primeiro filho pudesse ser concebido. Em 12 de abril de 1904, nasceu Herculano Carneiro de Farias. Depois, vieram ao mundo, quase sucessivamente, Donida, Francisco, Miquelina, Altino, Francisca, Clara, Maria, Marcos e Aladim. Dez filhos no total. Altino e Clara estavam felizes e realizados com a família.
O pai de Altino, Marcos Gonçalves de Farias, ingressou na Guarda Nacional. Ele era aliado de Francisco Ferreira de Albuquerque e amigo dos membros da família Ramos de Lages. Em 1898, recebeu o título na hierarquia militar de "Coronel". Adotou Curitibanos como seu lar, pois comprou no local, pelo menos, duas fazendas, às quais foram destinadas para a pecuária, tornando-se um dos mais importantes fazendeiros da região. Era um homem inteligente, entendido sobre vários assuntos da sua época e considerado uma pessoa sensata, sobretudo para negociar. Entrou para a política pelo Partido Republicano Catarinense — PRC. Nos quadriênios dos governadores Gustavo Richard e Hercílio Pedro da Luz exerceu por ato governamental, o cargo de 1.º Juiz Substituto da Comarca. Exerceu ainda, o cargo de Superintendente Municipal durante o período de 1914 até 1918, época do fanatismo e jaguncismo. Justamente no início da sua gestão, se fez sentir a ação destruidora dos membros da "Irmandade Cabocla", quando foram incendiadas 22 casas da vila, inclusive a Superintendência e o seu arquivo municipal. No que lhe concerne, Altino seguiu os caminhos do pai, também foi integrante da Guarda Nacional, assumindo hierarquicamente o posto de Major. Lutou, com o pai e demais membros militares, contra os fanáticos da “Irmandade Cabocla”, formada em Taquaruçu e espalhada pela região do Contestado.
Após o incidente com os fanáticos em Curitibanos, Altino dedicou-se à política e aos afazeres cotidianos das suas propriedades. A sua residência ficava ao lado de onde hoje está localizada a Praça da República, ao lado da Igreja católica Imaculada Conceição. A maioria das casas de Curitibanos estava localizada naquela região, pois foi no alto daquela coxilha que o povoado foi fundado nos primeiros anos do século XIX.
Em 29 de junho de 1911, o Major Altino Gonçalves de Farias, fez uma poesia e dedicou à sua amada esposa, Clara, na ocasião do seu aniversário.
Salve, 29 de junho
Salve data de alegria
Faz hoje 28 anos
Que viste a luz do dia
Salve data feliz
Feliz para mim sem fim
Eu nasci para ser teu
Tu nasceste para mim
Me julgo feliz no mundo
Feliz em casar contigo
Eu falo em fé de verdade
Te adoro e sou teu amigo
Eu te saúdo Clarinha
Clarinha minha querida
Que Deus por misericórdia
Te dê mil anos de vida
(Teu marido e amigo, Altino)
Em 11 de setembro de 1923, Altino era o Presidente do Conselho Municipal de Curitibanos. Havia em na cidade, duas correntes políticas. Às vezes, nos registros antigos, dá a entender, que apesar de opositores, invariavelmente, os membros dessas duas correntes estavam juntos, lutando pelo progresso e o bem-estar dos curitibanenses. Entretanto, a realidade era outra. De um lado, historicamente, representantes da família Almeida acreditavam que podiam se perpetuar no poder. Foi assim com Henrique Paes de Almeida (Sênior), com o seu filho Henrique Paes de Almeida (Júnior), com Graciliano Torquato de Almeida, e posteriormente, com Salomão Carneiro de Almeida. Ao todo, no longo percurso da história, representantes da família Almeida mandaram em Curitibanos por cerca de 25 anos. Historicamente, a oposição política, começou quando, no ano de 1902, Francisco Ferreira de Albuquerque lançou-se como candidato pelo Partido Republicano Catarinense — PRC, à superintendência municipal. Albuquerque alegava e alardeava publicamente, que não havia administrador em Curitibanos, visto que o Coronel Henrique, ficava mais tempo na sua fazenda, do que cuidando dos interesses dos curitibanenses. Na apuração dos votos, foi constatado que o “velho” Almeida venceu as eleições. Então entrou em cena o velho amigo, irmão da maçonaria e compadre, Vidal Ramos que era Deputado Estadual na ocasião. Também o ajudou, o irmão desse, Belizário Ramos, o Superintendente da cidade de Lages. Arrumaram, às pressas, votos “a bico de pena” no Distrito de Canoinhas, que fazia parte do território de Curitibanos. Por força da Lei Saraiva, que ditava as regras dos eleitores, anularam alguns votos e urnas. O resultado dessa artimanha política levou à vitória de Francisco Ferreira de Albuquerque.
O voto denominado “bico de pena” consistia na seguinte prática. Aos eleitores era apresentado um livro de assinaturas. Nesse livro, os eleitores escreviam apenas o nome do candidato, conforme instruídos pelo mesário ou responsável pelo recolhimento das assinaturas. No caso da eleição de 1902, no Distrito de Canoinhas, todos os eleitores escreveram o nome de Francisco Ferreira de Albuquerque no livro, sem o uso de nenhuma cédula ou opção de escolha. Conforme os relatos dos antigos moradores de Curitibanos, mesmo assim, a vitória daquele pleito, foi do Coronel Henrique Paes de Almeida. Em seguida, como alternativa estratégica ou Plano “B”, o Deputado Estadual e também Coronel da Guarda Nacional, Vidal José de Oliveira Ramos Júnior, que tinha forte influência política na região, conseguiu anular algumas urnas em Curitibanos, dando dessa forma, a vitória ao seu “pupilo” Albuquerque.
Desde essa época, a família Almeida e os amigos de Albuquerque não se deram bem. Marcos Gonçalves de Farias era amigo de Albuquerque e membro do mesmo partido, o PRC. Consequentemente, Altino Gonçalves de Farias seguia a ideologia do pai. Por mais que pareça estranho, encontramos um registro de que em 19 de dezembro de 1926, estavam reunidos em Florianópolis, numa visita ao Governador Adolpho Konder, Graciliano Torquato de Almeida e Altino Gonçalves de Farias. Como escrevi antes, a oposição, por vezes, parecia desaparecer, pelo menos externamente, o que não ocorria no interior das mentes desses políticos, tratavam-se silenciosamente, como inimigos.
Na noite do dia 19 de maio de 1929, ocorreu um baile no Clube Sete de Setembro, em Curitibanos. Era uma noite fria, prenunciando que o inverno seria rigoroso. Havia no interior do salão de festas, muitas famílias de curitibanenses, entre as presentes, estava Altino Gonçalves de Farias, sua esposa Clara e o filho menor, de nome Altino Farias Filho, de 15 anos. O superintendente municipal era o Tenente-Coronel da Guarda Nacional, Henrique Paes de Almeida (Júnior). Num ato de insanidade, mobilizou a polícia local para acabar com o baile. Os policiais se posicionaram, na escuridão daquela noite, na Praça da República e apontaram seus fuzis para a porta do salão do Clube Sete de Setembro. Num determinado momento, Altino Farias Filho saiu para respirar ar fresco, visto que no salão estava quente por causa do calor provocado pelos casais dançarinos. Ele estava com um “pala”, uma peça de roupa utilizada em dias e noites de frio pelas pessoas do sul do Brasil. Atrás dele veio a sua mãe, Clara. Altino Filho, na calçada, ao lado da rua, fez menção de que iria tirar o “pala”, levantando-o, foi neste exato momento que um dos policiais que estava oculto na praça da República, disparou contra o rapazola, atingindo-o de raspão na cabeça. Dona Clara, ao ver o filho atingido, correu para auxiliá-lo, também sendo atingida por outro disparo vindo do mesmo lugar escuro da praça. Ao som de tiros, o baile parou, Altino Gonçalves de Farias, vendo o filho e a esposa caídos na calçada, atirou a esmo para a praça, não acertando em ninguém. Entretanto, há um registro encontrado no Jornal Conciliador, edição n.º 12 daquele ano, relatando que outro homem também morreu naquele tiroteio, não revelando na matéria, o seu nome.
Clara foi levada para a residência de Francisco José Duarte, que ficava do outro lado da Praça, onde faleceu, às seis horas da manhã do dia seguinte. Altino Farias Filho, conseguiu se recuperar da bala que raspou a sua cabeça, entretanto, no ano seguinte, mais precisamente, no dia 31 de maio de 1930, faleceu em decorrência de meningite, no Hospital de Caridade da cidade de Lages.
Altino Gonçalves de Farias desgostou-se pela vida, por perder a sua esposa e filho de forma traumatizante. Apesar do seu empenho político em Curitibanos, dentro do agora (1931), Partido Liberal Catarinense, se acalmou, pois, precisou de tratamento médico contra dois problemas: insuficiência cardíaca e piora das funções renais. Faleceu no mesmo Hospital de Caridade da cidade de Lages, em 23 de janeiro de 1932, às duas horas da madrugada.
Apesar dos transtornos e das histórias tristes do passado, os descendentes de Altino Gonçalves de Farias foram pessoas honradas, que fizeram parte da história curitibanense, contribuindo significativamente para o progresso e a ordem do local, no decorrer dos anos.
Referências para o texto:
Cartório de Registro Civil da cidade de Lages. Registro de óbito de Altino Gonçalves de Farias. Livro de registro de óbitos, folha 65, registro n.º 396.
Cartório de Registro Civil da cidade de Lages. Registro de óbito de Altino Farias Filho. Livro de registro de óbitos, folha 301, registro n.º 174.
Cartório de Registro Civil da cidade de Curitibanos. Registro de óbito de Clara de Paula Carneiro de Farias. Livro de registro de óbitos, folha 5, registro n.º 8.
Conflicto em Curitibanos. Jornal Conciliador. Florianópolis, ed. n.º 12, p.3
FARIAS, Miquilina. Poesia copiada, quando tinha 13 anos.
Fotografia, acervo do Museu Histórico Antonio Granemann de Souza de Curitibanos/SC.
Jornal República. Anno XVIII, ed. 1445, 1923, p. 1
Jornal República. Anno I, 19 de dezembro de 1926, ed. 68, p. 2
POPINHAKI, Antonio Carlos. Francisco Ferreira de Albuquerque. Blog Curitibanenses. On-line, disponível em: https://curitibanenses.blogspot.com/2018/03/francisco-ferreira-de-albuquerque.html
POPINHAKI, Antonio Carlos. Marcos Gonçalves de Farias. Blog Curitibanenses. On-line, disponível em: http://curitibanenses.blogspot.com/2021/03/marcos-goncalves-de-farias.html
Registro de Óbito de Altino Farias Filho: "Brasil, Santa Catarina, Registro Civil, 1850-1999," database with images, FamilySearch (https://familysearch.org/ark:/61903/3:1:S3HY-X3C7-S45?cc=2016197&wc=MXY5-GY7%3A337700801%2C337700802%2C339512101 : 22 May 2014), Lages > Lages > Óbitos 1928, Abr-1931, Abr > image 152 of 204; cartórios no estado de Santa Catarina (city registration offices), Santa Catarina. e mais:
https://www.familysearch.org/ark:/61903/3:1:S3HY-X3C7-S45?i=151&wc=MXY5-GY7%3A337700801%2C337700802%2C339512101&cc=2016197
Registro de Óbito de Altino Gonçalves de Farias — "Brasil, Santa Catarina, Registro Civil, 1850-1999," database with images, FamilySearch (https://familysearch.org/ark:/61903/3:1:S3HT-X9VZ-H1?cc=2016197&wc=MXYR-RN5%3A337700801%2C337700802%2C339822101 : 22 May 2014), Lages > Lages > Óbitos 1931, Maio-1935, Out > image 33 of 201; cartórios no estado de Santa Catarina (city registration offices), Santa Catarina. e mais:https://www.familysearch.org/ark:/61903/3:1:S3HT-X9VZ-H1?i=32&wc=MXYR-RN5%3A337700801%2C337700802%2C339822101&cc=2016197
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