sexta-feira, 4 de abril de 2025

Gervalino Borges de Sena


Texto de Antonio Carlos Popinhaki


Nascido em 9 de maio de 1939 em Lages, Santa Catarina, Gervalino Borges de Sena foi um homem cuja trajetória se confunde com a história de São Cristóvão do Sul, cidade para a qual se mudou em 1961 e que ajudou a construir com suas mãos, seu trabalho e seu amor pela família e comunidade. Sua vida, marcada por simplicidade, perseverança e dedicação, deixou um legado que transcende gerações.

Desde jovem, Gervalino, carinhosamente chamado de “Gerva”, enfrentou os desafios de uma época sem tecnologia, trabalhando em serviços braçais até realizar seu grande sonho: tornar-se motorista. Aos 18 anos, conheceu América Maria de Mattos, poetisa e escritora que mais tarde teria seu legado eternizado no Hino Municipal (que no momento deste texto ainda não foi oficializado), e na Biblioteca Pública de São Cristóvão do Sul, o grande amor de sua vida, com quem se casou em 1961 e teve nove filhos: Leni (falecida aos 17 anos), Magali, Gilmar, Cléa (atual secretária de Assistência Social), Val, Lu, Gilberto, Claudia (jornalista do "A Semana") e Daniel (diretor da Unidade de Segurança Máxima). Juntos, formaram uma família numerosa que se expandiu para 14 netos e 8 bisnetos, seis dos quais ele ajudou a criar pessoalmente.

Sua vida profissional foi marcada por determinação. Após comprar seu primeiro caminhão e transportar toras, tornou-se motorista da Prefeitura de Curitibanos, onde todo seu salário foi investido na construção da casa de madeira da família em 1978, no centro de São Cristóvão do Sul. Seu talento ao volante levou-o ao Jornal de Santa Catarina em Blumenau e, posteriormente, à Transportadora Fabris, onde como motorista do Diário Catarinense percorria mais de 700 km diários, de terça a domingo, para distribuir notícias pelo Oeste catarinense, prova viva de que era, como dizia sua família, “a vida em movimento”.

Os últimos capítulos de sua vida foram marcados por um episódio que comoveu toda a região. Em 28 de março de 2025, Gervalino, então com 85 anos e diagnosticado com Alzheimer, saiu de casa em sua Fiat Strada vermelha (placa MJP 1057) e desapareceu. Seu paradeiro permaneceu desconhecido até que, no dia seguinte, um grupo de 15 cavaleiros da Associação dos Tropeiros de Curitibanos, que mapeavam o trajeto para a Cavalgada do Dia do Tropeiro, avistou seu veículo abandonado em uma plantação de soja nos fundos da filial de Curitibanos da Cooperativa Agropecuária Camponovense — Coocam, entre a BR-470 e a SC-451. Alessandro Alves do Amaral foi o primeiro a perceber o idoso caído e debilitado no meio da plantação. Imediatamente, os cavaleiros acionaram a Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros, guiando-os pelo terreno de difícil acesso até o local.

A atitude heroica dos cavaleiros foi reconhecida oficialmente pela Câmara de Vereadores de Curitibanos, que aprovou por unanimidade a Moção de Congratulações nº 6/2025, destacando “a atuação decisiva e solidária” do grupo. O documento, proposto pelo vereador Jairo Pereira Neto e subscrito por toda a bancada, ressaltou que “a postura adotada por esses homens é digna de reconhecimento público, por representar um verdadeiro exemplo de cidadania, empatia e respeito à vida”. A Prefeitura Municipal de São Cristóvão do Sul também se manifestou, emitindo nota de pesar que destacava não apenas o profundo impacto da perda para a comunidade, mas também a gratidão pelo esforço dos cavaleiros que permitiram à família uma despedida digna.

Apesar dos esforços, Gervalino faleceu em 31 de março no Hospital Hélio Anjos Ortiz, vítima de insuficiência renal e falência múltipla dos órgãos. Seu velório realizado na Câmara Municipal de Vereadores de São Cristóvão do Sul e o sepultamento no dia seguinte reuniram centenas de pessoas, entre familiares, amigos e autoridades, testemunhando o profundo respeito que conquistara. A cerimônia de 7º dia foi realizada na Igreja Matriz, completando as homenagens a este homem que, como destacou a moção da Câmara de Curitibanos, “reforça o papel fundamental das organizações comunitárias na construção de uma sociedade mais justa e atenta ao próximo”.

Gervalino Borges de Sena partiu, mas seu movimento continua - nas estradas que percorreu, na família que construiu (incluindo a esposa América, cuja homenagem eterna permanece na biblioteca municipal que leva seu nome) e na comunidade que ajudou a edificar. Como escreveu Pierre Nouy e a Câmara de Curitibanos lembrou em sua homenagem: “Não existe outra via para a solidariedade humana senão a procura e o respeito da dignidade individual”. E nisso, Gerva foi mestre, tanto em vida quanto no episódio final que uniu tropeiros, autoridades e cidadãos comuns em uma rede de solidariedade que se tornou seu último e talvez mais eloquente legado.



Referências para a construção do Texto:


CRISTINE, Kelly. Morador de SCS falece dois dias após ser localizado. Jornal A Semana. Edição n.º 2148, de 4 de abril de 2025, p. 22.


Curitibanos —  Câmara Municipal de Vereadores — Moção de Congratulações n.º 6.


Curitibanos — 13.ª Sessão Ordinária, ocorrida em 03 de abril de 2025.


SENA, Claudia. Gervalino Borges de Sena, ele era a vida em movimento. Jornal A Semana. Edição n.º 2148, de 4 de abril de 2025, p. 11.


São Cristóvão do Sul — Nota de Luto publicada na página do município do dia 31 de março de 2025.

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